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Polícia Civil do Piauí
Artigo - Perícia em celular: necessidade de autorização judicial?
27/01/2012 - 13:03  
  
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Por Alesandro Gonçalves Barreto, Delegado de Polícia Civil de 1ª Classe do Piauí

O celular é utilizado como meio para o cometimento de vários delitos, desde a simples ameaça até extorsão mediante seqüestro. Em algumas ocorrências no Piauí já foram apreendidos criminosos com filmagens de agências a serem assaltadas, arquivos salvos no aparelho móvel. O celular, hoje em dia, é um aparelho com múltiplas funções como câmera de vídeo, máquina fotográfica, GPS, MP4 dentre outros arquivos que podem ser anexados/baixados.

No decorrer de uma investigação policial, ao proceder a apreensão de celulares, a autoridade policial faz a remessa dos aparelhos a fim de que sejam periciados e extraídos dados. Entretanto, ao ser recebido pela criminalística, o delegado é informado que tal procedimento não pode ser realizado sem um mandado judicial sob o argumento de que os dados contidos no telefone são acobertados pelo sigilo telefônico. Tal conduta não é compatível com os ditames constitucionais em vigor. É necessário, se fazer uma diferença entre “ter acesso aos dados contidos no telefone móvel apreendido” de “interceptação telefônica”, popularmente conhecida como “escuta”. No primeiro caso, a autoridade policial necessita saber se os dados contidos naquele aparelho têm qualquer relação com o evento criminoso ou algum elemento que possa individualizar a autoria e materialidade delitiva nos precisos termos do art. 6º do Código de Processo Penal. Não há, nesse caso, nenhuma violação ao conteúdo de conversa telefônica ou de dados. Já no caso da interceptação telefônica, há acesso ao áudio e dados de conversas mantidas entre interlocutores, sendo, portanto acobertado pelo art. 5º, XII da Constituição Federal. Nesse último caso, há necessidade de autorização judicial para se efetivar a medida.

Nesse cenário, é óbvio que, ao realizar a perícia em um telefone celular, extraindo-se o conteúdo da agenda telefônica e demais dados interessantes para a investigação policial, excetuando-se alguma conversa telefônica que porventura esteja gravada no referido aparelho, não há que se falar em quebra de sigilo telefônico. Assim, quando se realiza uma perícia em aparelho celular, não há nenhuma violação ao conteúdo das conversas mantidas entre os interlocutores. Nossos Tribunais têm decidido reiteradamente sobre essa questão.  

Ao tratar sobre a ilegalidade de prova colhida em inquérito policial, a 5ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Habeas Corpus nº 66.368 - PA (2006/0201607-4), tendo como relator o Ministro Gilson Dipp, mencionou que “Quanto à apontada ilegalidade da prova colhida durante o inquérito policial, o argumento defensivo não merece prosperar.Os acusados sustentam que foi realizada a quebra do sigilo telefônico do co-réu, o qual teria efetuado os disparos de arma de fogo contra a vítima, sem a devida autorização judicial. Esta afirmação encontra guarida no fato de os policiais terem supostamente verificado o registro das últimas chamadas efetuadas e recebidas pelos dois celulares apreendidos em poder do co-réu. Tal conduta, todavia, não configura quebra do sigilo telefônico, uma vez que somente foram averiguadas quais teriam sido as últimas ligações feitas, bem como as recebidas pelos celulares apreendidos, cujos registros se encontravam gravados nos próprios aparelhos.

Na hipótese dos autos não houve requerimento à empresa responsável pelas linhas telefônicas, no tocante à lista geral das chamadas originadas e recebidas, tampouco conhecimento do conteúdo das conversas efetuadas por meio destas linhas. Ademais, consoante o disposto no art. 6.º, incisos II e III, do Código de Processo Penal, é dever da autoridade policial apreender os objetos que tiverem relação com o fato, o que, no presente caso, significava saber se os dados constantes da agenda dos aparelhos celulares teriam alguma relação com a ocorrência investigada .”

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao tratar do assunto, relatou que “A simples verificação dos números das últimas chamadas feitas e recebidas constantes na memória do telefone celular não significa, por si só, violação ao sigilo telefônico desde que a apreensão do aparelho seja legítima. A garantia constitucional da inviolabilidade das comunicações telefônicas se refere à vedação de escutas clandestinas, a qual não se configura com a simples checagem dos últimos números registrados na memória do aparelho, ainda que esta seja realizada por outra pessoa que não o proprietário.” (TRF 4ª R., AC n.º 2002.04.01.029123-1/PR, Rel. Fábio Rosa, 7ª T., un., DJ 21.5.03). Em outro acórdão asseverou: PENAL. TENTATIVA DE ESTELIONATO. ART. 171 C/C ART. 14, II DO CP. ALEGAÇÃO DE TORTURA NA ESFERA POLICIAL. VIOLAÇÃO DE SIGILO TELEFÔNICO. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA. DOLO. VANTAGEM ILÍCITA NÃO OBTIDA POR CIRCUNSTÂNCIAS ALHEIAS À VONTADE DOS AGENTES. QUADRILHA OU BANDO. ART. 288 DO CP. CARACTERIZAÇÃO. (...) 2. A simples verificação dos números das últimas chamadas feitas e recebidas constantes na memória do telefone celular não significa, por si só, violação ao sigilo telefônico desde que a apreensão do aparelho seja legítima. A garantia constitucional da inviolabilidade das comunicações telefônicas se refere à vedação de escutas clandestinas, a qual não se configura com a simples checagem dos últimos números registrados na memória do aparelho, ainda que esta seja realizada por outra pessoa que não o proprietário. (...) 7. Apelações improvidas. (TRF 4ª Região. SÉTIMA TURMA. ACR 200204010291231. Relator Des. Federal FÁBIO BITTENCOURT DA ROSA. DJ 21/05/2003 PÁGINA: 808).

No mesmo sentido é o entendimento do Tribunal Regional Federal da 3ª Região em Apelação Criminal Nº 0011947-59.2009.4.03.6000/MS. A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Eliana Marcelo, ao proferir o voto destacou: Inicialmente, afasto a preliminar de nulidade do processo decorrente da ilicitude de prova, sustentada pelos réus apelantes. Determina o art. 5º, XII, da Constituição: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;A defesa alega violação ao dispositivo transcrito pelos policiais que abordaram os acusados em operação rotineira e apreenderam seus aparelhos celulares, por meio dos quais, em razão da verificação das últimas mensagens de texto recebidas no aparelho de XXXX, localizaram o automóvel conduzido por XXXXX que transportava a droga então apreendida. Contudo, não se caracterizou ofensa ao sigilo de comunicação telefônica protegido pela Constituição Federal e regulamentado pela Lei n. 9.296/96. Primeiramente, deve-se ressaltar a licitude da apreensão do aparelho celular em posse do co-réu em procedimento normal e regular de fiscalização realizado por policiais militares lotados junto à Polícia Rodoviária Estadual/MS. A consulta das últimas mensagens de texto recebidas em seu celular não representa quebra de sigilo telefônico, pois não houve acesso às conversas telefônicas realizadas, mas sim simples verificação de registro gravado no próprio aparelho.

Ao analisar a Apelação Criminal nº 0011947-59.2009.4.03.6000/MS, tendo como relator o Rel. Des. Henrique Herkenhoff, j. em 31/8/2010, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul também possui o mesmo entendimento, conforme se infere: APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINAR DE NULIDADE DA TRANSCRIÇÃO DE MENSAGENS ELETRÔNICAS CONSTANTES DO TELEFONE CELULAR DO RÉU. As transcrições realizadas não violam o direito constitucional (art. 5º, XII), pois não foram obtidas de forma ilícita. Os policiais não se anteciparam à ação do réu e investigaram sua correspondência sem seu conhecimento. Na verdade, o réu já havia lido os torpedos e oportunizou seu manuseio pelos policiais que realizaram o flagrante, já que não os deletou. No caso dos autos, portanto, não houve quebra do sigilo de correspondência, pois essa já não era mais sigilosa, tendo sido aberta e mantida incólume por seu destinatário, o qual a deixou à mão da autoridade investigativa que realizou o flagrante. O réu estava praticando um delito e, como é curial, os objetos ligados ao crime são passíveis de apreensão e perícia técnica correspondente. Não há que se falar, portanto, que os dados contidos no celular apreendido estejam acobertados pela garantia do sigilo e da reserva jurisdicional. Tal conduta retarda as investigações e vai contra o princípio da oportunidade existente na atividade policial. Assim, respostas que poderiam ser dadas rapidamente por parte de uma delegacia que investiga determinado crime, ficam prejudicadas aguardando por uma ordem judicial não necessária.

Portanto, não há necessidade alguma de mandado judicial para realizar perícia em aparelho telefônico móvel apreendido pela Polícia.

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